A máfia dos uniformes: funcionário de empresa investigada relata as fraudes com a Prefeitura

A máfia dos uniformes

Ex-executivo de empresa investigada pela PF, Djalma Silva conta como funciona o esquema de fraudes com a Prefeitura de São Paulo. E diz que o fornecimento dos kits de uniformes envolve pagamento de propina acertada por Alexandre Schneider.

Por IClaudio Dantas Sequeira – IstoÉ
Segunda-feira, 20 de agosto de 2012

 

Empresário de 42 anos, natural de Pindamonhangaba (SP), Djalma S. Silva trabalhou por mais de um ano na Diana Paolucci, empresa investigada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público por integrar um cartel de fornecedoras de uniformes para escolas da rede pública. A Diana Paolucci chegou a ser proibida, por 11 meses, de firmar contratos com a Prefeitura de São Paulo. Com salário fixo de R$ 10 mil e uma comissão de 30%, Djalma era diretor-comercial da companhia e tinha a tarefa de abrir portas no poder público. Foi nesta condição que ele participou de reuniões e negociatas que tentavam ampliar a participação da Diana Paolucci no mercado de fornecimento de kits escolares. Agora Djalma está fora da empresa e diz que se desligou por não concordar com os métodos adotados durante a negociação dos contratos. Na quarta-feira 15, Djalma Silva recebeu a reportagem de ISTOÉ. Em entrevista exclusiva, resolveu escancarar o funcionamento do submundo da máfia dos uniformes em São Paulo, denunciada pela revista em sua última edição.

De acordo com o empresário, que pediu para não mostrar o rosto, temendo colocar em risco sua integridade física, o esquema não apenas está ativo como envolve o pagamento de propina para integrantes da Prefeitura de São Paulo. O relato compromete o candidato a vice na chapa de José Serra à Prefeitura de São Paulo, Alexandre Schneider. Segundo revelou ISTOÉ na reportagem da última semana, Schneider deu aval para a atuação da máfia no período em que ocupou a Secretaria da Educação. Na entrevista, Djalma foi além. Disse que o grupo de empresários estava preocupado com o avanço do candidato Celso Russomanno (PRB) nas pesquisas de intenção de voto. Já a vitória de José Serra seria, segundo ele, a garantia de que o esquema continuará em pleno funcionamento. “Acertamos (uma comissão de) 4%. Se o Serra ganhar, você paga isso; se for o Russomanno, tem que renegociar. Aí tem que fazer um novo processo. Isso foi negociado pelo Alexandre Schneider, vice do Serra, e Julio Manfredini”, disse Djalma.

Julio Manfredini é proprietário da empresa Capricórnio, uma das investigadas pela PF e o MP por formação de cartel. Segundo Djalma, o percentual de 4% foi revelado em reunião no dia 8 de agosto. Nesse dia, os empresários se reuniram para discutir o impacto da eleição municipal nos negócios do grupo, precisamente a renovação dos contratos de fornecimento de uniformes e material escolar, que somam mais de R$ 140 milhões. O encontro ocorreu no café de um hotel a poucos metros da Coordenadoria dos Núcleos de Ação Educativa (Conae), órgão responsável pelas licitações da secretaria. Quem conduziu a conversa, segundo Silva, foi Eldo Castello Umbelino, dono da Nilcatex, fornecedora de uniformes. Ele contou que vinha de uma reunião anterior com Julio Manfredini e que ele estaria muito preocupado que a vitória de Russomanno atrapalhasse as pretensões do grupo. O bate-papo entre os empresários foi gravado pelo ex-executivo da Diana Paolucci e encaminhado ao Ministério Público.

O empresário se diz arrependido de ter integrado o esquema, conta que começou a atuar na área de licitações de merenda escolar há quase dez anos e, a partir de 2008, resolveu ampliar sua atuação para outros insumos. À reportagem, Djalma Silva apresentou cópias de denúncias protocoladas por seu advogado junto aos gestores públicos e órgãos de controle, alertando sobre as fraudes nos editais e a combinação de preços entre as empresas, antecipando até o resultado de licitações. Desde então, diz que vem sofrendo perseguições e ameaças de morte contra si e sua família. “Um dia desses me enviaram um envelope com a foto do meu filho saindo da escola. Era um recado claro”, afirma.

Um dos que o teria ameaçado seria seu ex-patrão, Abelardo Paolucci. “Ele disse que vai acabar comigo, que é mais bandido do que eu imagino. Eu gravei tudo”, diz. Silva espera assinar nos próximos dias um acordo com o Ministério Público e avalia pedir proteção policial. De fato, o executivo tornou-se uma testemunha-chave. Segundo ele, o esquema foi implementado por Serra ainda no governo do Estado e importado para a Prefeitura paulistana, onde operou desde 2006 pelas mãos do secretário Schneider, que deixou o cargo justamente para concorrer como vice na chapa tucana. Tanto em nível municipal como no estadual, o esquema seria coordenado pela empresa Capricórnio. De acordo com Djalma Silva, Manfredini, o dono da empresa, mantém relação estreita com Schneider. “Ele tem acesso aos editais com antecedência, faz as alterações para beneficiar o seu grupo de empresas. Combinam preços e pagam comissões aos políticos”, afirma Silva. Esses pagamentos, acrescentou a testemunha, ocorreriam em restaurantes na via Dutra e no escritório da Capricórnio na avenida Angélica, em Higienópolis.

Essas empresas, na semana passada, saíram a público para rejeitar as denúncias publicadas por ISTOÉ. Em “informe publicitário” nos jornais de São Paulo, a Diana classificou de “inverídicas” as informações. Documentos entregues por Silva ao Ministério Público, porém, mostram o contrário. São cópias de e-mails e mensagens de celular trocadas com os empresários e políticos envolvidos no esquema. Esses documentos mostram, por exemplo, a negociata entre o ex-diretor da Diana Paolucci e Ortiz Júnior, que é candidato a prefeito de Taubaté pelo PSDB e filho do presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), José Bernardo Ortiz.

O órgão é responsável por todas as licitações do governo de São Paulo na área da educação e possui orçamento de quase R$ 3 bilhões. Falando em nome do pai e usando sua influência de cacique tucano, Júnior teria procurado Djalma Silva no ano passado para levantar recursos para sua campanha. “Ele queria R$ 7 milhões e pediu 10% do contrato. Consegui 5%”, lembra. A oferta de Júnior incluía, segundo Silva, milionários contratos para fornecimento de mochilas e uniforme escolar. Na semana passada, Manfredini e Schneider foram procurados por ISTOÉ, mas não se pronunciaram até o fechamento desta edição.

 

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