Por Tamires Sampaio – Dois anos do assassinato de Marielle: a quem serve o feminicídio negro no Brasil?

O Dia Internacional da Mulher (#8M) foi marcado pela luta em defesa da vida das mulheres que são vítimas de violências diárias, sociais e estruturais. Milhares ocuparam as ruas de São Paulo em defesa de uma democracia feminista e antirracista, e por justiça para Marielle, Claudias e Dandaras.

Justiça para mulheres negras, que são vítimas também do genocídio da população negra, por meio da política de morte promovida pelo Estado brasileiro, que executa uma política de segurança baseada na manutenção da ordem e prevenção de riscos. Essa ação protege uma parcela em enquanto incentiva a criminalização e o extermínio de outra. Marielle, brutalmente assassinada pela milícia do Rio de Janeiro; Claudia, arrastada no asfalto por uma viatura e assassinada no Rio de Janeiro; Dandara, mulher trans negra, espancada e assassinada em Fortaleza. As três são símbolos de resistência, são representações das estatísticas que aumentaram nos últimos anos.

Segundo os dados do Ministério da Saúde, divulgados pelo Atlas da Violência de 2019, lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), foram registrados 4.936 assassinatos de mulheres em 2017.[1] É uma média de treze homicídios por dia, sendo que 66% das vítimas são negras, mortas por arma de fogo e, em grande parte dos casos, vítimas de violência doméstica.

Observando esses dados, é possível constatar que a cada três horas uma mulher negra é assassinada no Brasil.

As mulheres negras, que recebem menos da metade do salário dos homens brancos[2], além de serem maioria nos empregos informais, são também 65% das vitimas de violência obstétrica[3]. São também quatro vezes mais vitimas de morte materna do que as mulheres não negras.[4] Além disso, são maioria nos presídios femininos (62%)[5], chegando a 97% da população carcerária feminina no estado do Acre.

Marielle Franco e sua família. Foto: Arquivo pessoal da irmã, Anielle Franco

Em 14 de março de 2020, dois anos após a execução brutal de Marielle Franco, ainda não foi respondida a pergunta: Quem mandou matar Marielle?

As investigações apontam para uma relação com a família que hoje ocupa o Palácio do Planalto. Mesma família que homenageia torturadores, milicianos e que exalta a política de morte contra a população pobre, negra, periférica e contra as mulheres e as LGBTs.

Marielle Franco se tornou um símbolo de luta e resistência contra o genocídio da população negra. Também por isso, é importante que a gente questione não apenas sobre os mandantes de seu assassinato, mas também sobre quem se beneficia dessa política de morte, exclusão social e encarceramento a qual todas as mulheres negras brasileiras estão submetidas.

Neste mês internacional de luta das mulheres, é necessário que seja compreendida a importância de construir políticas antirracistas no combate à violência contra as mulheres. Nosso feminismo tem raça, classe social e está nas periferias de nosso país.

Para combater essa política de morte, precisamos que exista uma transformação da estrutura social brasileira. Desta forma, é essencial que exista um fomento à participação de mulheres negras na política, para a formulação e a execução de politicas públicas de redução da desigualdade e da violência, pois, como já dito pela filósofa e ativista Angela Davis: “quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela, porque tudo é desestabilizado a partir da base da pirâmide social onde se encontram as mulheres negras”.

Tamires Gomes Sampaio é advogada, mestra em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e militante da Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN). Foi a primeira presidente negra do Diretório Acadêmico do Mackenzie. 

Facebook/Instagram: @soutamires.sp

Twitter: @soutamires_sp

Fontes:

[1] https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-06/ipea-homicidios-de-mulheres-cresceram-acima-da-media-nacional

[2] https://brasil.elpais.com/brasil/2019/11/12/politica/1573581512_623918.html

[3] https://www.ufrgs.br/humanista/2019/11/19/machismo-mata-e-mulheres-negras-sao-as-que-mais-morrem/

[4] https://www.geledes.org.br/saude-e-mulher-negra-quando-cor-da-pele-determina-o-atendimento/

[5] https://carceraria.org.br/mulher-encarcerada/brasil-e-o-4o-pais-que-mais-prende-mulheres-62-delas-sao-negras

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