“O que aprendi na Bíblia fez eu me identificar com a esquerda”, diz pastor

Não existe nenhum conflito entre ser cristão e se identificar com a esquerda. Quem faz a afirmação é o pastor Daniel Elias, da Assembleia de Deus em Parque Eldorado, na cidade de Duque de Caxias (RJ). Aliás, ele conta que passou a se identificar com os valores da esquerda devido ao que aprendeu nas igrejas que frequentou e na leitura da Bíblia.

“Sendo pentecostal, fui membro de igrejas supertradicionais, como a Assembleia de Deus. E o que fez eu me identificar com a esquerda foi justamente o que aprendi nessas igrejas. Não só isso, mas principalmente o que aprendi com Deus na Bíblia sagrada”, conta, em entrevista ao site do PT. “Cristo sempre se identificou com os pobres”, completa.

Sobre acusações de que o Partido dos Trabalhadores não gosta de evangélicos ou que pode perseguir os crentes caso volte a governar o país, Daniel Elias diz saber que se trata de algo infundado. “Até porque o partido esteve na Presidência por 13 anos e, nessa época, não houve a mínima perseguição aos crentes por parte do governo. Muito pelo contrário, os membros das igrejas gozavam de prosperidade.”

Hoje, ressalta, a situação mudou para a maioria dos evangélicos. “São muitos os que estão desempregados e passando dificuldade”, atesta, antes de acrescentar: “Dentro das igrejas existem muitos membros inconformados com a situação política e econômica do país”. Leia a seguir a entrevista com Daniel Elias, crente desde 2001 e ungido a pastor em 2008. 

Existe conflito entre os valores da esquerda e os princípios cristãos?

Eu sou crente desde 2001. Sendo pentecostal, fui membro de igrejas supertradicionais, como a Assembleia de Deus. E o que fez eu me identificar com a esquerda foi justamente o que aprendi nessas igrejas. Não só isso, mas principalmente o que aprendi com Deus na Bíblia sagrada.

Minha igreja sempre fez trabalho nos presídios, nas bocas de fumo e nas cracolândias. Acreditando na recuperação de qualquer ser humano, sempre ofereceu abrigo às pessoas vulneráveis, como mendigos, viciados, ex-presidiários, prostitutas etc.

A palavra de Deus, desde o Antigo ao Novo Testamento, sempre esteve do lado dos pobres e dos oprimidos. Quando Deus libertou Israel, eles se encontravam num cativeiro de 430 anos do Egito. Jesus disse, em Lucas 6:20: “Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o reino de Deus”. Cristo sempre se identificou com os pobres. Uma vez, quando ele foi questionado por João Batista sobre a autenticidade do seu ministério, ele deu a seguinte resposta: “Os cegos veem, e os coxos andam; os leprosos são purificados, e os surdos ouvem; os mortos são ressuscitados, e aos pobres é anunciado o evangelho.” (Mateus 11:5). Até porque, como Deus, Jesus poderia ter vindo da forma que quisesse, mas, ao invés de vir como rei ou rico, ele preferiu nascer numa manjedoura, ser pobre e trabalhar como carpinteiro.

Como os evangélicos foram tratados nos governos Lula e Dilma?

Muitos têm falado que o PT é um partido anticristão, e que a Dilma e o Lula não gostam de evangélicos. Dizem até que, se o Lula voltar à Presidência, a igreja corre o risco de ser perseguida. Sabemos que essa é uma acusação infundada, até porque o partido esteve na Presidência por 13 anos e, nessa época, não houve a mínima perseguição aos crentes por parte do governo. Muito pelo contrário, os membros das igrejas gozavam de prosperidade, e os ministérios tinham as portas abertas para realizarem seus trabalhos, tanto na rua quanto nas emissoras de televisão. Lembrando que, em 2003, foi o Lula quem sancionou a lei de liberdade religiosa na presença de diversos pastores evangélicos. Na ocasião ele disse: “A partir de agora, é livre o direito de criar uma igreja e praticar uma religião”. Lembro que, na época da Dilma, o meu então pastor apresentou para ela o seu trabalho de recuperação de dependentes químicos. E ela ficou deslumbrada. Tanto a Dilma quanto o Lula sempre tiveram uma relação amistosa com os pastores evangélicos brasileiros.

Como estão as condições de vida da comunidade evangélica atualmente, considerando a situação econômica do país?

Sabemos que boa parte dos evangélicos está nas periferias e bairros pobres do Brasil. Nossas igrejas são compostas em sua grande maioria por mulheres, negros e pobres, que encontraram nas igrejas a oportunidade que muitas das vezes não encontraram na sociedade em que vivem. E, nessa situação atual, são muitos os que estão desempregados e passando dificuldade. A pandemia também ceifou a vida de muitos crentes, até mesmo de cantores e pastores conhecidos. A verdade é que dentro das igrejas existem muitos membros inconformados com a situação política e econômica do país, mas se sentem retraídos e acabam não se manifestando, para não confrontarem alguns líderes religiosos. A igreja evangélica é diversificada, e não existe, como na igreja católica, um pastor que responda por sua totalidade. Mas existe um grande respeito a toda liderança eclesiástica. Por isso que eu acho perigoso quando um pastor se posiciona politicamente. Não que isso seja errado. Mas o problema é quando ele espiritualiza a política, afirmando que um lado é de Deus e o outro do diabo. Colocando até mesmo como doutrina na igreja seu posicionamento ideológico. E isso acaba dividindo a igreja, e Jesus disse que um reino dividido não pode subsistir. O pastor, como cidadão, tem todo direito de apoiar o político que ele quiser, mas sabendo respeitar a liberdade de seus membros. As igrejas não podem ser partidárias.

Da Redação da Agência PT

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