Simão Zygband: O medo da morte pelas mudanças climáticas

Reprodução site Construir a Resistência

Quando em 2019 escrevi meu livro “Queimadas na Amazônia, uma aventura na selva”, um dos capítulos era exatamente sobre a devastação que estava ocorrendo já no primeiro ano de (des)governo Bolsonaro naquela região e as implicações que isso trariam para o país e para o sul e sudeste brasileiro. 

A floresta amazônica não é apenas considerada como o pulmão do mundo, mas é a responsável pela formação de gigantescos “rios voadores”, cursos d’água invisíveis que circulam pela atmosfera e se dispersam em forma de chuvas por todo o continente sul-americano. Com o desmatamento descontrolado, este processo está cada vez mais escasso. As secas estão se tornando muito frequentes.

Neste final de semana, diante de um cenário cada vez mais catastrófico, “choveu” cinzas na capital paulista e região metropolitana. Em parte, decorrência de um trágico incêndio que consumiu praticamente todo o Parque Estadual Juquery, um remanescente preservado de Cerrado, acabando com fauna e flora. Mas as queimadas, devido ao grande período de estiagem, pipocaram por todo o estado. A falta de chuvas facilita os incêndios nas matas.

A verdade é que o governador João Doria (PSDB, que se pretende presidenciável,  não tomou nenhuma medida para combater o grave incêndio, que consumiu 65% da área do Parque Estadual Juquery. Nenhum helicóptero de combate às chamas foi enviado ao local. 

Quem anda por São Paulo nestes últimos dias pode constatar a péssima qualidade do ar. Os medidores sempre apresentam a cor vermelha, sem que nenhuma atitude seja tomada. O paulistano e os paulistas estão respirando fumaça há vários dias. O cheiro de queimado invade as narinas e como lembrou o jornalista Anderson França, são cancerígenas. Há sofrimento para asmáticos e para portadores de rinites e sinusites. As principais prejudicadas são as crianças, que lotam os postos de saúde, mesmo durante a pandemia de Covid-19.

Preocupa esta absurda estiagem. Não há nenhuma manifestação governamental para que se comece a racionar água ou que se implante um rodízio de veículos durante um período maior, para diminuir também os poluentes despejados pelos automóveis na atmosfera. Tenho medo da morte por asfixia. Espero que não cheguemos a tão grave situação. E fazer a dança das chuvas, como faziam os índios.

Abaixo, um trecho do meu livro, que somente pode ser adquirido através da Amazon, já que sobraram poucos  exemplares impressos. Já demonstrava preocupação. 

 “Os números mostram que na década de 1970, a Amazônia havia perdido apenas 1% de seu território com o desmatamento e hoje esta cifra já atinge a casa dos 30%. É resultado de uma sucessão de governos que se omitiu para impedir um tipo de negócio na região com características predatórias, que visa o lucro rápido, sem nenhuma sustentabilidade ou planejamento econômico, mas extremamente cruel com o meio ambiente. Mas acelerou como nunca havia acontecido antes no atual governo. 

O agronegócio, um dos vilões do desmatamento da Amazônia, tem importância por produzir alimentos para boa parte do planeta, comercializados com a Rússia, China, Oriente Médio, Estados Unidos e até para os países latino-americanos. 

É grande fonte de divisas para o país. Mas, no Brasil, este tipo de negócio é permitido com pouca ou nenhuma fiscalização, e tem transformado o cerrado brasileiro e a floresta amazônica em gigantescos pastos e lavouras de soja, alimentos muitas vezes pulverizados por agrotóxicos, do qual o país é um dos maiores consumidores do mundo. Segundo informações, o agronegócio utiliza 370 mil toneladas de pesticidas por ano, a maior quantidade registrada em todo mundo, alguns deles letais.

A outra parte é a bovinocultura, outro vilão da destruição da Amazônia, que derruba a floresta para criação de gado, em um processo que se ateia fogo na mata para fazer a “limpeza” do campo onde serão confinados os bois. As árvores são derrubadas através de um processo conhecido como “correntão”, uma corrente gigante puxada por um trator, que coloca abaixo espécies centenárias em questão de segundos.

A Amazônia, que sofre com o forte desmatamento, engloba nove países da América do Sul, 60% dela em território brasileiro, e é parte considerável de toda a área florestada do planeta. Ela não é apenas considerada como o pulmão do mundo, mas é a responsável pela formação de gigantescos “rios voadores”, cursos d’água invisíveis que circulam pela atmosfera e se dispersam em forma de chuvas por todo o continente sul-americano. Há quem diga que sem essa umidade, as regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul brasileiro teriam se transformado em áreas desérticas. De certo modo, isso já está acontecendo”.

Simão Zygband

Simão Zygband é jornalista com passagem pelas TVs, jornais, rádios e assessorias de imprensa parlamentar e de administrações públicas. Foi coordenador de Comunicação no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Em fevereiro de 2020, lançou o livro “Queimadas da Amazônia – uma aventura na selva”. É conselheiro eleito do Plano Municipal do Livro, Literatura, Leitura e Bibliotecas de São Paulo (PMLLLB)

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