Com assistência social em crise, secretário de Doria abandona audiência pública

Filipe Sabará não quis ouvir os depoimentos dos trabalhadores e preferiu ir para outra reunião com dirigentes de corretoras de valores

Reprodução Facebook/SMADS

São Paulo – Apenas o segundo representante da sociedade civil tinha usado o microfone quando o secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento social, Filipe Sabará, se retirou da audiência pública promovida hoje (21) para debater a crise da assistência social na cidade de São Paulo. A atitude revoltou as pessoas que lotavam o Salão Nobre da Câmara Municipal e surpreendeu até mesmo os vereadores membros da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania e Relações Internacionais.

Era por volta das 11h30 e a audiência pública estava marcada para prosseguir até as 13h. Cercado por alguns vereadores da base do governo de João Doria (PSDB), Filipe Sabará saiu sem dizer nada e deixou a explicação para o líder do governo na Câmara, Aurélio Nomura (PSDB): o secretário tinha que ir a uma reunião com o prefeito e dirigentes das corretoras de valores da Cetip – BM&FBovespa.

“Esse governo está ficando contumaz nesse tipo de atitude. Ele fugiu da realização das 32 conferências regionais de assistência social, fugiu do debate no conselho municipal sobre a Portaria 41, fugiu do debate na conferência municipal e hoje, mais uma vez, acuado, mostrando despreparo e inabilidade de gestor à altura de uma cidade como São Paulo, o secretário se retira e deixa a assistência social a ver navios, afrontando inclusive os demais vereadores e o parlamento como um todo”, criticou o representante do Fórum da Assistência Social (FAS) Allan Francisco Carvalho.

“É lamentável, mas não é um ato isolado. É uma postura de governo que vem se repetindo em todos os espaços. É um governo que afronta sucessivamente todos os espaços de participação direta e controle social”, afirmou.

Apesar da saída do secretário ainda no começo da participação da população na audiência, Carvalho elogiou o auditório lotado numa fria manhã de inverno. “Foi mais uma grande demonstração de força dos trabalhadores e representantes das entidades de serviço social e usuários na luta em defesa do Serviço Único da Assistência Social.”

Entre os vereadores, uma das vozes mais críticas à postura do secretário Filipe Sabará veio justamente da ex-colega de governo e ex-secretária de Assistência Social, a vereadora Soninha Francine (PPS).

“Essa é uma marca do secretário, com o qual eu tive alguns problemas. Ele simplifica tudo de um jeito absurdo”, disse Soninha, citando a explicação do secretário de que os profissionais que atuam no atendimento às pessoas em situação de rua de manhã serão demitidos, mas recontratados para trabalhar à noite. O fim do atendimento pela manhã do Serviço Especializado de Abordagem Social (Seas) é uma das medidas polêmicas da atual gestão Doria.

“Ele afirma categoricamente que tem 1.700 contratados (pessoas em situação de rua)… Ele é um cara que lida com números fabricados por ele mesmo e insiste nesses números”, enfatizou a vereadora do PPS.

Segundo Soninha “ainda que os números fossem verdadeiros”, o modo de agir com o tema da vulnerabilidade social é equivocado, como se tudo “se reduzisse a números”. “Ele mexe com as pessoas, com os trabalhadores, com os números, ainda que fosse verdade, seria algo desconectado da realidade”, acrescentou. A ex-secretária de Doria afirmou ter receio de que as reuniões e audiências com a sociedade civil não sirvam para nada, diante da falta de diálogo de Filipe Sabará.

“Se ele for impermeável ao que as pessoas dizem, porque entende que é uma questão partidária, então que vá aos lugares e veja com os seus próprios olhos. Alguns assessores da secretaria fizeram questão de visitar pessoalmente inúmeros serviços de abordagem, mas não adianta, nem a assessoria técnica ele consegue ouvir. Então não é que ele não escuta os trabalhadores, ele não escuta ninguém”, afirmou Soninha Francine.

Para o ouvidor-geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Alderon Costa,  a terceira audiência pública sobre o tema deixou evidente o “desmonte” nas políticas de assistência social em curso na gestão Doria. “Gostaria de discutir o aprimoramento da assistência social, falar do orçamento, mas foi uma audiência de denúncia de fechamento de serviços e diminuição de convênio”, analisou. Ao citar a polêmica Portaria 41, que extingue o atendimento pela manhã à população em situação de rua, Alderon Costa disse que o governo não entende o serviço. 

“Acho que o secretário está equivocado, porque o serviço da manhã é tão importante quanto o da noite, sendo que de manhã tem a possibilidade de criar mais vínculos, é um momento privilegiado, enquanto à noite a demanda é outra, é por comida, pelo centro de acolhida, é um serviço mais concreto. Os dois serviços são importantes.”

Assim como os demais participantes da audiência pública, o ouvidor-geral da Defensoria Pública classificou de “grave” a saída repentina do secretário Filipe Sabará. “Esses espaços são importantes para estabelecer o mínimo de diálogo, que está rompido. Como um secretário de assistência social pode continuar seu trabalho rompendo com os trabalhadores, com as organizações e os usuários? O secretário precisa dialogar e ter firmeza no diálogo. É isso que o secretário precisa entender”, finalizou.

Mesmo sem a presença de Filipe Sabará, a audiência pública prosseguiu até o horário previamente estipulado. Segundo o presidente da comissão, vereador Eduardo Suplicy (PT), uma nova audiência tentará ser marcada novamente com a presença do secretário.

 

Fonte: Luciano Velleda, para a RBA

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