Juliana Cardoso: Por uma bancada feminina, feminista e petista na Câmara Federal

Site do PT São Paulo

No último dia 9, sábado, publiquei nas minhas redes sociais minha indignação com uma foto divulgada nas redes do  ex-presidente Lula. A imagem reúne representantes do PT e do PSB, partido indicado para ocupar a vaga de vice-presidente na chapa presidencial petista, e estampa a presença majoritária de homens brancos no encontro. A representação das mulheres petistas ficou a cargo exclusivamente da presidenta do PT, Gleisi Hoffmann. Pessoas negras e/ou transgêneras presentes: nenhuma. Jovens presentes do lado petista: nenhum, também.

Após expressar minha frustração com a cena, recebi o apoio de muitas mulheres, petistas e apoiadores que foram responsáveis pela maior parte dos comentários enviados. E também recebi críticas. A maioria delas vinda de haters bolsonaristas, mas também de homens de esquerda e algumas poucas mulheres.

A maior parte dos comentários negativos giram em torno de duas preocupações legítimas: a primeira com o fato de eu levar à público um tema que deveria ser tratado internamente e, outro mais grave, com a pseudo aproximação do meu coletivo com políticas identitárias, que deixariam para segundo plano a grave crise social e econômica que vive o Brasil hoje.

A primeira preocupação é muito simplista e pode ser rapidamente dissipada. O PT é o segundo maior partido de esquerda no mundo (atrás apenas do Partido Comunista Chinês). Na América Latina, é o maior em número de filiados e seguidores e o maior quando se trata de influência na sociedade. Para um partido deste tamanho nenhum tema pode ser tratado de forma unicamente interna.

Nosso partido não está livre do preconceito estrutural que baliza a cultura capitalista e reina no nosso país. É preciso olhar para dentro cotidianamente, de peito aberto, se quisermos ser o instrumento de transformação social que nos propomos a ser. Isto posto, é preciso que todes que se propõem a ser parte atuante do partido também estejam livres do medo do julgamento e possam debater nossas questões de forma sincera e explícita.

A segunda aflição dos companheiros e companheiras é a mais complexa e merece mais atenção. Primeiramente, é preciso reafirmar aqui meu compromisso com as eleições de Lula e Fernando Haddad em 2022.

Depois quero também relembrar que minha luta pela participação popular das mulheres, das indígenas e da juventude na política não é meramente identitária, decorrentes do fato de eu ser uma mulher periférica, de origem indígena e que entrou muito jovem neste meio, mas uma compreensão ideológica profunda e empírica da realidade que me cerca. Entendo que se o Partido dos Trabalhadores quer manter vivo seu projeto transformador, ele precisa estar profundamente atento às demandas populares. E nosso povo clama, também, por ver seu corpo e sua cara nas estruturas do poder. Não é mera atenção às identidades que compõem o todo da classe trabalhadora. É a convicção de que só quem sabe dos seus próprios problemas pode construir políticas para transformar a realidade coletiva.

As mulheres, junto à comunidade negra, os jovens e LGBTQIA+,  são as mais prejudicadas com as políticas neoliberais impetradas no Brasil desde o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff. Foram as primeiras a ficarem desempregadas depois da relativização dos direitos trabalhistas promovida por Michel Temer, e também foi a primeira representação a ser extirpada das esferas de Brasília. De lá para cá os índices de violência contra a mulher aumentaram. Foi uma mulher pobre e preta a primeira a morrer de COVID-19 no Brasil. O trabalho feminino dentro de casa só aumentou e acredito que hoje vivemos mais pressionadas pelas múltiplas tarefas que cumprimos na sociedade.

Esse ataque às mulheres não é, como querem forçar alguns, apenas uma coincidência do destino. Acontece que o neoliberalismo depende da superexploração da vida das mulheres, dos pretos, dos indígenas, dos jovens e das LGBTQIA+. Justamente por isso, o Partido que se propõe a ser instrumento de transformação social não pode abrir mão de representar a pluralidade que dá o tom da cultura e da composição social brasileiras. Precisamos meter os pés nas portas do Poder para que os parlamentos e os governos expressem a intensa atividade política das mulheres, assim como dos jovens, das negras e negros, dos indígenas e da população LGBTQIA+.

Em uma entrevista recente para o podcast de Mano Brown, o rapper Emicida lembrou de forma genial que as esferas em que o Brasil se destaca, do futebol à cultura, são aquelas em que há a presença da pluralidade racial brasileira.

O PT se empenhou em dar repercussão a necessidade das pessoas mais jovens tirarem seu título de eleitor, para fazer do seu primeiro voto uma ferramenta para retirar Bolsonaro do poder. Mas será mesmo que essa juventude vai acreditar num projeto de governo com o qual não consegue se identificar? Repito, não é mera preocupação com o respeito às diversas identidades constituintes do nosso país. É compromisso com a desmistificação da política, compromisso com o incentivo a que cada vez mais pessoas enxerguem a política como um espaço para a resolução dos seus problemas.

Enquanto o corpo associado à política for exclusivamente um corpo opressor, reforçaremos a separação entre povo e política. E tenho certeza de que um projeto inclusivo como o do Partido dos Trabalhadores precisa se propor a dar cabo desse muro entre o público e o privado. Esta não é só uma preocupação estética diante de um registro momentâneo. É uma preocupação com os rumos que nosso Projeto Democrático Popular precisa trilhar para seguir sendo a representação do amadurecimento político da classe trabalhadora brasileira.

Pela pluralidade petista no parlamento 

Entremos, então, naquilo que realmente interessa: o PT já é o partido que mais nos representa, nas instâncias internas, com participação ampla de diversos setores da sociedade. Nossas bases mostram isso e nossa direção espelha essa realidade. Mas, ainda que as eleições de 2020 tenham sido ótimas para oxigenar o Partido na inclusão e renovação, pouco avançamos quando o assunto é a nossa Câmara Federal. Principalmente no estado de São Paulo, onde o PT não elegeu nenhuma mulher para Deputada Federal nas últimas eleições.

Temos companheiros valorosos e que realizam um trabalho crucial para a consolidação do nosso projeto. Mas nós, mulheres, das periferias, LGBTQIA+, pretas e indígenas ainda estamos sub representadas nos espaços de poder. Enquanto o Partido dos Trabalhadores não compreender que precisa garantir estrutura para as candidatas e candidatos que representam uma renovação, inclusive geracional, nós não avançaremos na disputa de camadas ainda mais amplas da sociedade.

Nós não queremos apenas um discurso inclusivo e uma capacidade de atuação interna no Partido. Não queremos apenas uma legenda! Queremos construir a possibilidade real de nosso partido ter uma bancada forte na Câmara Federal. E para que isto ocorra, sem repetir os erros do passado, é preciso que o PT Paulista firme um compromisso afirmativo com as mulheres.

Eu lutarei pelo projeto inclusivo e justo representado pelo Partido dos Trabalhadores e, também, para que ele seja sempre representativo do amadurecimento político das trabalhadoras e trabalhadores. E hoje, esse amadurecimento indica que o Brasil quer uma política com pluralidade para construir um poder com voz e cara do nosso povo!

*Juliana Cardoso é vereadora em São Paulo (SP) pelo PT

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