O anúncio feito pela Nissan na tarde de ontem, (24), de que vai suspender temporariamente as operações em sua fábrica em Resende (RJ), é mais um sintoma do apagão generalizado que acometeu o setor automobilístico, graças à má conduta do desgoverno Bolsonaro na gestão da crise do coronavírus. A exemplo de outras montadoras, a empresa vai conceder férias coletivas aos colaboradores da unidade para ajudar a conter o avanço da covid, inclusive entre sua própria força de trabalho.
O setor, que no ano passado paralisou drasticamente as atividades em abril, quando a curva de contágio da primeira onda se elevou, caminha agora, um ano depois, para o mesmo destino. A pressão combinada de surtos da doença no chão de fábrica e de crise de fornecimento de insumos, por absoluta ausência de política industrial do desgoverno Bolsonaro, paralisa montadora por montadora.
Na tarde de segunda, a Scania anunciou a interrupção das atividades na unidade de São Bernardo do Campo (SP) após reunião com representantes do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC). “A parada se deve ao agravamento da pandemia e o consequente colapso no sistema de saúde de todo o país”, afirmou em nota o sindicato.
No mesmo dia, a Volvo havia anunciado um corte significativo na produção de caminhões na fábrica de Curitiba (PR). A Mercedes-Benz fez o mesmo na terça (23), paralisando as atividades nas unidades de São Bernardo do Campo (SP) e Juiz de Fora (MG).
O coordenador do Comitê Sindical na Mercedes-Benz, Max Pinho, destaca que desde o início do mês o sindicato debate com a base medidas de proteção da saúde dos trabalhadores. “A nossa defesa prioritária é a vacina para todos já. Mas hoje, na falta de vacinas, a melhor solução é o distanciamento social”, afirmou o dirigente.
Segundo Max, o aumento de casos refletiu nas fábricas. “O pessoal está bastante preocupado, a maioria já perdeu parentes, amigos, inclusive colegas de trabalho. A medida vai garantir maior proteção dos trabalhadores e também chama a atenção de todas as esferas do governo para que tomem ações efetivas de combate à pandemia e de proteção ao emprego e renda”, ressalta.
A Volkswagen iniciou nesta quarta a suspensão das atividades. A decisão foi tomada em conjunto com os sindicatos das cidades que abrigam as plantas da Volks no país – São Bernardo do Campo (SP), São Carlos (SP), Taubaté (SP) e São José dos Pinhais (SP). Em nota, a empresa destaca o agravamento da pandemia e o colapso na taxa de ocupação dos leitos de UTI. Só no Grande ABC, a covid já matou mais de cinco mil pessoas.
Vacina para todos ou paralisação geral
O presidente do SMABC, Wagner Santana (Wagnão), afirma que o índice de contágio nas fábricas não é diferente dos números do restante do país. Mesmo com as medidas de segurança reivindicadas pelos sindicatos e adotadas pelas empresas, quase cinco mil trabalhadores das montadoras da região do Grande ABC já foram afastados do trabalho devido à doença desde o início da pandemia.
Dos cerca de 30,5 mil trabalhadores na Volkswagen, Mercedes-Benz, Scania, Toyota e General Motors, dez morreram, contabiliza o sindicato. Mas para Wagnão, os números não são só números, são vidas.
“A gente quer que pare tudo para defender vidas e direitos, e não dá para esperar ações do governo federal porque temos um genocida e negacionista no comando do país”, critica o dirigente. “Temos que ter vacina para todos e todas ou um isolamento severo. Só assim para a gente conter essa doença.”
O consenso entre montadoras e a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) é de que a vacinação em massa é o único instrumento capaz de normalizar as atividades econômicas e industriais no país. A tendência é de que mais montadoras também anunciem pausas nos próximos dias.
Outras, como a Honda, que interrompeu a produção do Civic no início de março, e a Fiat, que dispensou 10% dos trabalhadores para reduzir a produção, alegam falta de matéria-prima. A General Motors afirmou, em resposta à agência de notícias Reuters, que não via motivos para interromper as operações no Brasil devido à covid. Mas foi obrigada a suspender a produção de seu campeão de vendas, o Onyx, por falta de semicondutores para abastecer a unidade de Gravataí (RS).
Por ironia, a apenas trinta quilômetros de Gravataí, em Porto Alegre, está sediada a única empresa na América Latina capacitada a produzir circuitos integrados: o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec). Criado por Luiz Inácio Lula da Silva em 2010, o Ceitec já registrou mais de 44 patentes de diversos tipos de semicondutores, inclusive o chip do passaporte brasileiro.
Neste momento crítico, o Ceitec poderia estar produzindo os semicondutores que faltam nas linhas de montagem em diversos ramos da indústria de transformação. Mas em vez de seu ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, organizar uma política industrial que conduza as demandas do setor, Jair Bolsonaro preferiu decretar a liquidação do Ceitec.
A extinção da empresa foi decretada por Bolsonaro em dezembro do ano passado. No mesmo mês, o deputado Patrus Ananias (PT-MG), secretário-geral da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional, protocolou projeto de decreto legislativo (PDL 557) para suspender o decreto. No momento, o oficial da reserva da Marinha Abílio Eustáquio de Andrade Neto comanda a diluição da empresa – e junto, da soberania nacional.
Da Redação, com CUT.