Com corte de recursos, governo ameaça dois milhões de pacientes de câncer

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Os deputados federais Alexandre Padilha (PT-SP) e Paulo Pimenta (PT-RS) protocolaram na Câmara um requerimento para que o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, esclareça a Casa sobre a crise no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). Por falta de recursos do governo federal, a instituição suspendeu nesta segunda-feira (20) a produção de medicamentos para câncer.

A medida pode paralisar o atendimento a até dois milhões de pacientes em todo o país, estima a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN). O Ipen produz 85% da demanda nacional de radiofármacos e radioisótopos, que são medicamentos e insumos usados no diagnóstico e tratamento do câncer.

O orçamento do órgão passou de R$ 165 milhões em 2020 para R$ 91 milhões recebidos até agosto de 2021. Apenas para adquirir os insumos necessários à produção de radiofármacos e radioisótopos, além de fazer contratações, o Ipen precisa de R$ 89,7 milhões até dezembro de 2021.

Na sexta-feira (17), Padilha também pediu ao Tribunal de Contas da União (TCU) que investigue a paralisação da produção de insumos pelo Ipen. Membro da Comissão Externa da Câmara dos Deputados que discute ações contra o avanço do coronavírus, ele afirmou que “a medida é imprescindível para a saúde pública no país”.
É uma combinação macabra de desprezo à vida: ao cortar recursos para a produção de medicamentos e insumos para diagnósticos, com a ganância do lucro, ao ensaiar abrir este setor para interesses privados”, afirmou o parlamentar, que foi ministro das Relações Institucionais no Governo Lula e ministro da Saúde no Governo Dilma Rousseff.
“A compra de insumos usados na radioterapia e nos exames de diagnóstico por imagem no tratamento do câncer não pode ser paralisada com a justificativa da pandemia do Sars-Cov-2. Tal possibilidade revelaria uma completa incompetência e má gestão do órgão público que afetaria diretamente entre 1,5 e 2 milhões de pessoas em todo o Brasil”, concluiu o documento do deputado petista.
O Ipen é uma instituição pública de pesquisa técnico-científica, desenvolvimento e ensino, gerido técnica e administrativamente pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), autarquia do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). O órgão produz materiais utilizados em exames de imagem como raio-x, tomografia, ressonância magnética, cintilogafia e mamografia.
Em comunicado enviado às clínicas e hospitais brasileiros, o Ipen afirmou que “entende perfeitamente”, que a ausência dos produtos “resultará em transtornos familiares de grande monta. Sobretudo, nos pacientes que necessitam de atendimento”.
Enfrentamos a grande redução dos recursos atribuídos pela Lei Orçamentária Anual (LOA) à CNEN e à forte e desfavorável variação cambial, em 2021”, justificou a nota. O Ipen também revelou que esgotou todas as possibilidades de diálogo com o governo federal para ter mais verba e não paralisar a produção, mas que não teve sucesso.

Pontes tenta apagar o incêndio

Na última quinta-feira (16), em nota, a pasta do ministro-astronauta Pontes revelou que desde junho vem trabalhando com o Ministério da Economia, do ministro-banqueiro Paulo Guedes, “para a maior disponibilização de recursos para a produção de radiofármacos pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares”.

“Para a recomposição do orçamento do Instituto, o Governo Federal está sensibilizando o Congresso pela votação e aprovação do PLN 16/2021 prevista para a próxima semana”, disse a nota. Caso aprovado o projeto, haveria um orçamento adicional de R$ 34,6 milhões para o Ipen. Outros R$ 55,1 milhões estão sendo buscados para completar os R$ 89,7 milhões que o instituto precisa para produzir os radiofármacos.

Mas a aprovação da lei pode levar tempo e a medida ainda precisa passar por sanção presidencial para entrar em vigor. Esse intervalo deve levar ao desabastecimento do setor por semanas, afirma a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear.

O presidente da entidade, George Coura Filho, revelou que o último carregamento de iodo, usado no tratamento do câncer na tireoide, foi entregue nesta segunda, e o fornecimento de Lutécio 177, usado no tratamento de tumor neuroendócrino, foi suspenso. “Estamos sem nenhuma outra opção, é desesperador”, disse ao Estadão.

Coura Filho informou que já procurou sem sucesso todos os ministérios para tentar resolver o problema, mas não houve resposta até o momento, “só ciência do recebimento das minhas demandas”, lamentou.

O presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), Celso Cunha, avalia que a crise já é grave, e haverá um apagão no tratamento de câncer no País. Os mais afetados deverão ser os tratamentos que dependem muito do iodo radioativo, produto que é monopólio do Ipen e que perde a validade em dois dias, sendo fornecido quase diariamente aos hospitais e clínicas.

Cunha lembrou que o Ipen não está conseguindo importar o mineral molibdênio, base para a produção de vários componentes. O órgão importa radioisótopos de produtores na África do Sul, Holanda e Rússia, além de adquirir insumos nacionais.

“Durante toda a pandemia os servidores do Ipen conseguiram manter a produção, e parar agora por falta de planejamento é muito frustrante. É uma situação que já se tinha conhecimento desde o início do ano, quando aprovaram o orçamento. O Ipen informou que só teria recursos até agosto”, criticou o pesquisador do órgão Luis Antonio Genova, diretor do Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal do Estado de São Paulo (Sindsef-SP).

“O Brasil compra toda semana os insumos para a produção dos radiofármacos, que chegam na quinta-feira (23) para serem processados pelo Ipen. Se algo não for feito, ficaremos um bom tempo sem poder fazer o tratamento dos pacientes”, antecipou.

Da Redação da Agência PT, com agências

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