O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou, na noite desta terça-feira (1º), o portal Memorial da Democracia, acervo histórico online que tem como objetivo registrar as lutas do povo brasileiro por um país mais justo e igual. Os primeiros módulos publicados contém documentos, vídeos, fotos e depoimentos sobre o período da ditadura (1964-1985) e a redemocratização até 2002. Nas próximas etapas serão registradas as lutas de outros períodos, até compreender os 515 anos do país. O ato de lançamento aconteceu no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde teve início a trajetória política de Lula, para mais de 2.000 pessoas.
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Participaram do evento Ivo Herzog, filho do jornalista Vladimir Herzog e fundador do Instituto de educação em direitos humanos que leva seu nome, Carina Vitral, presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST), o rapper Rappin’ Hood, o ator Sérgio Mamberti e o jornalista Franklin Martins.
Em sua fala, Lula destacou que o Memorial da Democracia é, além de uma exposição permanente da história das lutas do povo brasileiro, uma ferramenta para combater a “irracionalidade emocional” que se instalou em parte da sociedade brasileira. O ex-presidente comparou as motivações das manifestações de ódio contra o PT e os governos Lula e Dilma e as manifestações por mais direitos.
“Isso é democracia. Se manifestar contra, se manifestar a favor. Aplaudir, vaiar. Torcer para um time, torcer para outro. E aqui neste sindicato, ninguém pode reclamar, porque todo mundo já xingou alguém e já carregou uma faixa contra alguém. Então, a gente não pode estar nervoso por manifestações contra nós. Temos de encarar isso com uma certa normalidade”, ponderou. “Agora, a gente tem de saber por que eles estão se manifestando. Aqui tem gente que foi presa, que foi torturada, e em torno de que a gente lutava? Sempre que fomos para a rua, fomos reivindicar melhores condições de vida para o povo brasileiro”.
“A gente ia para a rua para valorizar o salário mínimo; tem gente agora indo pra rua contra o aumento do salário mínimo. Nós cansamos de ir pra rua tentando melhorar a condição de vida da empregada doméstica; tem gente indo à rua agora contra as melhorias para as empregadas, que eles preferem chamar de secretária, mas não querem pagar direitos. Fomos para a rua defender as cotas para o povo negro nas faculdades. Tem gente indo para a rua contra”, ressaltou.
“Contra esses, a gente tem que lutar”, concluiu o ex-presidente. “Se a gente não fizer esse debate, estaremos enfraquecendo o processo democrático neste país. Vocês estão vendo o que está acontecendo com a crise de imigração na Europa, e aqui no Brasil também, com os haitianos. Existe uma política de preconceito contra as pessoas mais humildes do mundo inteiro”.
Em seu discurso, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, afirmou que fortalecer a democracia não apenas no Brasil, mas na América Latina e em todo o mundo , é um legado do governo do ex-presidente Lula e uma das missões do instituto. E, para isso, a memória é essencial. “Eu ficava imaginando se a gente pudesse de alguma forma fazer com que as pessoas sentissem um pouquinho do cheiro do gás lacrimogêneo que teve aqui nas nossas greves, naquela época. O barulho do helicóptero naquele 1º de maio extraordinário que aconteceu aqui. Certamente faria nossa juventude pensar na nossa democracia”, contou.
“Aqui, neste espaço que estamos lançando hoje, eu tinha 22 anos quando comecei a militar ao lado do companheiro Lula. Com 22 anos, eu não sabia muita coisa, e muita coisa eu aprendi aqui. Aprendi que democracia é liberdade, verdade, justiça. É a possibilidade de criar oportunidades para todos. É aprender a ter tolerância. É combater a corrupção. Tudo isso eu aprendi pela nossa gente, pelo nosso povo”, afirmou. “O companheiro Lula, para milhões de brasileiros como eu, é o maior inspirador para a gente construir uma prática democrática”.
Colaboradora do Memorial da Democracia, a historiadora Heloisa Starling disse que “o memorial propõe uma reflexão sobre o nosso passado, mas tem de sensibilizar a imaginação de cada visitante para que ele se emocione com os acontecimentos da história”. “A história não é finita, ela é cheia de perguntas. Ela é necessariamente inconclusa. Então, será que vamos consolidar as conquistas sociais dos últimos anos? Que papel teremos no mundo daqui para frente? Vamos consolidar os valores da República, de compartilhamento de tudo que é comum? Essa história será feita de escolhas e consequências. Essa é também a história que se vê no memorial”.
Ivo Herzog celebrou, em sua fala, as diversas iniciativas de memória e direitos humanos em andamento tanto por meio do Instituto Vladimir Herzog quanto pelo Instituto Lula e outras organizações, com o apoio de governos com compromisso com tais questões, como o do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT). “Hoje é possível fazer esse tipo de esforço também graças à presidenta Dilma, que criou a Comissão Nacional da Verdade e a Lei de Acesso à Informação. Porque falar da memória do meu pai é sempre doloroso, mas se a partir dessa história criamos uma agenda positiva, me dá alegria”, afirmou Ivo, que afirmou que, graças ao apoio da prefeitura de São Paulo, seu Instituto oferece formação em direitos humanos para 10 mil crianças. Ele homenageou ainda o jornalista Franklin Martins, que o apoiou na criação do projeto Resistir é Preciso, e ao ex-ministro dos Direitos Humanos Paulo Vannuchi.
Conhecer a verdade, conhecer a democracia
A secretária de Educação do Estado de Minas Gerais, Macaé Evaristo, defendeu em sua fala iniciativas como o Memorial da Democracia como forma de melhorar o processo educacional nas escolas do país, para formar alunos mais críticos e conscientes. “Espero que não tenhamos mais no ensino fundamental, como eu tive na minha época, apenas as histórias dos impérios, sua grandeza e sua queda. Nós só não sabíamos onde estava aí a história das pessoas”, afirmou.
“Um Memorial como esse nos ajuda muito em cada uma das escolas deste país. Nós temos uma tarefa muito importante que se chama Plano Nacional de Educação. Mas se quisermos fazer com que, de fato, nossos herdeiros consigam continuar essa jornada, é fundamental que a gente não deixe esquecer tantas lutas”, disse.