A ex-presidente Dilma Rousseff afirmou nesta segunda-feira (21/12), em entrevista a Breno Altman durante o programa 20 Minutos, que o Brasil perdeu seu protagonismo no mundo durante o governo Bolsonaro. Segundo ela, durante os governos do PT, o país tinha projeção, inclusive com “reconhecimento explícito” de outros governos.
“O Brasil saiu de uma postura protagonista que tinha nas épocas do presidente Lula e da minha, em que nós tínhamos, de fato, um posicionamento em relação à participação e à posição do Brasil. Tínhamos uma posição no acordo do clima, isso até com reconhecimento explícito pelo [então presidente do EUA Barack] Obama e pelo governo francês”, disse
“O Brasil, nesse âmbito, não existe. Nós não existimos como protagonistas. Não temos uma presença. A gente pode até participar, mas não tem presença relevante. Até para essa última reunião climática, o Brasil sequer foi convidado, o que seria inconcebível seis anos atrás”, afirmou.
Dilma disse acreditar que a vitória de Joe Biden nos EUA não necessariamente representa uma mudança de posição do país. “Mas acredito que algumas coisas podem se desdobrar nesse sentido. Uma possibilidade seria uma recomposição dos EUA com seus aliados. Não haverá mudanças na política de contenção da China”, disse.
Esquerda na América Latina
Para ela, a esquerda latino-americana está retomando o fôlego. “Isso graças à mobilização popular que temos visto nestes países [latino-americanos], como se o povo tivesse ido às ruas dizer basta”, disse.
“Acredito que a América Latina passa por muitas dificuldades, não é trivial dirigir um país latino-americano durante uma pandemia, tudo isso cria uma dificuldade de gestão. O que eu tenho visto é uma alteração muito expressiva na correção de forças, seja com a volta do MAS [Movimento ao Socialismo] na Bolívia, ou com aquela estrondosa recepção ao [ex-presidente Evo] Morales”, afirmou.
Brasil
A ex-presidente também comentou sobre a eleição na Câmara dos Deputados, que vai definir a sucessão do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para ela, seu partido, o PT, está na situação de tentar mitigar perdas, ao declarar apoio ao bloco do atual presidente da Casa.
Para ela, no entanto, não há diferença entre os candidatos que estão colocados à sucessão. “Não acredito em hipótese alguma que há uma diferença substantiva entre Arthur Lira (PP-AL), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Eles são do PP! Muito menos entre o Lira e o Baleia Rossi (MDB-SP). Inventaram uma diferença. Inventar que o Baleia Rossi é mais democrático que o Arthur Lira é dose pra mamute”, disse.
Segundo Dilma, o que interessa para o governo é o que chamou de “herança” do ex-deputado Eduardo Cunha, que foi presidente da Câmara durante seu segundo mandato no Planalto. “A partir do momento em que o [jornalista Elio] Gaspari diz que o [ex-presidente Michel] Temer está cogitado pra chanceler porque é amigo do Biden, as razões são muito estranhas. Eu acredito que, para o Bolsonaro, interessa esse espectro que é a herança do Eduardo Cunha, que é o MDB e a sua criatura, que é o centrão. O centrão é uma criatura do Cunha”, afirmou.
Já para as eleições de 2022, Dilma disse acreditar que o ex-presidente Lula é “a chance de derrotar efetivamente Bolsonaro”. “Sem o Lula, acho que vai se tornar muito difícil [o PT ganhar], não impossível, mas muito difícil ganhar em 2022.”
Anos no poder
Questionada por Altman sobre a escolha do economista Joaquim Levy como ministro da Fazenda de seu segundo mandato, Dilma fez o que chamou de “autocrítica”.
“Por que ele? O Joaquim Levy tinha sido secretário do Tesouro do governo Lula, e nós íamos precisar fazer um ajuste. A autocritica que posso fazer é que acho que ele estava muito aquém da compreensão do que ocorria. Foi uma escolha que deu muito atrito, levou a muita divergência, principalmente na área do controle de crédito. Acho que ele não percebeu o tamanho da recessão que vinha, e não conseguiu aprovar a pauta que interessava”, afirmou a ex-presidente.
Dilma também falou do impeachment que sofreu em 2016. “No Brasil, tiveram de nos tirar do poder, para poder constitucionalizar a política de apropriação do orçamento pelo neoliberalismo, que foi o teto dos gastos. É feito logo no dia seguinte [ao impeachment]. Vamos deixar claro que quem rompeu a democracia no brasil e corroeu todos os princípios do estado democrático de direito foi a direita neoliberal”, opinou.
Publicado originalmente em Opera Mundi/ UOL