Carlos Zarattini e Ciro Biderman
A implantação dos corredores de ônibus foi paralisada desde 2005. Em 17 anos no governo do Estado, o PSDB construiu menos de 30 km de metrô
Os recentes incidentes nas linhas do metrô e da CPTM evidenciam uma situação caótica que reflete a falta de planejamento e investimento em transporte público nos últimos anos na região metropolitana de São Paulo.
Os gigantescos congestionamentos que resultam em duas horas ou mais para chegar ao trabalho para uma parcela significativa da população são evidência do efeito da (falta de) política de transporte das últimas gestões.
Os mais prejudicados com esse descaso pela mobilidade são os mais pobres. Mais de 75% das viagens motorizadas da população com rendimento inferior a R$ 760 ocorrem pelo meio coletivo.
É verdade que esse padrão não é uma novidade na cidade de São Paulo. O descaso com o transporte público tem prevalecido desde a gestão Maluf, em 1993. A única exceção nos últimos 20 anos foi a gestão Marta Suplicy, que construiu 70 quilômetros de novos corredores, além de restaurar os 46 quilômetros construídos na década de 1980.
A implementação do bilhete único deu um passo fundamental em direção a uma rede de transportes interligada. O metrô se integrou ao sistema apenas em 2005, graças à pressão da população.
Em 17 anos no governo do Estado, o PSDB construiu menos de 30 quilômetros de linhas de metrô. A linha 4, prevista para 2010, ainda não entregou 5 estações. A expansão da linha 5 até o Hospital do M’Boi Mirim está prevista para 2020.
As demais linhas são apenas projetos. A linha Congonhas-Morumbi do monotrilho mal iniciou suas obras. A linha Vila Prudente-Cidade Tiradentes deverá ter apenas um trecho de dois quilômetros em 2014.
A CPTM está muito distante de um serviço próximo do metrô. Tem um planejamento tão caótico que o secretário de Transportes Metropolitano reconheceu que o governo Alckmin não estava preparado para tantos passageiros, conforme publicado nesta Folha, no dia 30 de março (na reportagem “Governo culpa súbito aumento de usuários”).
A implantação dos corredores de ônibus foi paralisada desde 2005. Dos 68 km prometidos, nenhum foi entregue até o momento. Nenhum tipo de planejamento ou controle foi implantado. Dependendo do trajeto e do horário, são necessárias mais de duas horas para percorrer 17 km.
A prefeitura se comprometeu com R$ 1 bilhão por ano para o metrô, mas até agora apenas R$ 975 milhões foram transferidos para “o governo estadual [que] decide onde aplicar os recursos”, como afirmou o prefeito Gilberto Kassab nesse espaço (“Omissões, avanços e desafios”, no dia 3 de abril).
Como não tem nenhum plano para o transporte coletivo, ele prefere simplesmente repassar o valor. É como um pai que, em vez de educar seu filho, prefere dar dinheiro.
A omissão no transporte público desta gestão está evidenciada na última pesquisa da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos). Apenas 18% avaliam como bom o sistema de transporte coletivo da cidade. Os ônibus municipais, que tinham 61% de avaliação boa e excelente em 2004, agora têm só 40%.
Os micro-ônibus que atendem a periferia tinham 59% de aprovação em 2004. Em 2011, 39%. Enquanto isso, 45% dos usuários ligam a violência à superlotação dos veículos. E 24% se sentem desrespeitados pelas más condições do serviço.
Só vamos superar o “apagão do transporte” com uma política que supere a letargia dos governantes atuais. Um sistema moderno de ônibus integrado aos trilhos é uma decisão política que os últimos governos não tomaram.
Um sistema de transporte público de qualidade é a única maneira sustentável de acesso ao trabalho, educação e outros serviços públicos. O transporte público é um instrumento fundamental para redução do trânsito, melhoria da qualidade do ar, da segurança energética e da mudança climática.
Se essa mudança de política não ocorrer imediatamente, corremos o risco de paralisar a cidade, como ocorreu sistematicamente nas últimas semanas.
CARLOS ZARATTINI, 51, ex-secretário municipal de Transportes de São Paulo, é deputado federal pelo PT
CIRO BIDERMAN, 45, é professor e pesquisador do da FGV. É também pesquisador afiliado do MIT (Massachusetts Institute of Technology)