Mais uma vez, a dolarização dos preços dos combustíveis recai sobre a população. Levantamento da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) registrou um aumento médio de 3,3% no preço da gasolina nos postos na semana passada. Com isso, o valor médio varia de R$ 6,321 a até R$ 7,499 por litro, segundo a ANP.
O preço do botijão de 13 quilos também sofreu alta, de 1,8% nas revendas esta semana, superando pela primeira vez a casa dos R$ 100 no preço médio nacional (R$ 100,44). O etanol é outro que está mais caro. Em uma semana, o preço médio do litro nos postos subiu 0,92%, passando dos R$ 4,775 praticados até 9 de outubro para R$ 4,819 na semana encerrada em 16 de outubro.
A pesquisa da ANP identificou ainda nova alta no preço do diesel. O produto agora custa em média R$ 4,976, aumento de 0,3% em relação à semana anterior. Assim, a alta acumulada desde o reajuste de 9% nas refinarias, no início de outubro, é de 5,7%.
No ano, a Petrobras já elevou o preço do diesel em 50% em suas refinarias. Nas bombas, a alta acumulada é de 30%. Já a gasolina acumula alta de cerca de 51%. Os caminhoneiros ameaçam com greve a partir de 1º de novembro por causa do aumento do diesel, entre outras reivindicações.
Em vigor desde o último dia 9, o percentual do reajuste nas refinarias (7,2%) é o mesmo para a gasolina e o gás de cozinha. A justificativa da Petrobras também é a mesma de sempre: compensar parte da elevação das cotações internacionais do produto.
Nesta segunda-feira (18), em entrevista à CNN Rádio, o diretor institucional do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados (Comsefaz), André Horta, afirmou que a mudança na “política de preços equivocada” da Petrobras é a única solução para a alta dos combustíveis.
“Enquanto não se alterar a política de paridade internacional da Petrobras, que é de 2017 e deu problema desde então, enquanto mantiver a política que não privilegia os custos de produção, continuaremos com esse problema”, defendeu, criticando a proposta bolsonarista de alteração nas regras do ICMS, em discussão no Congresso.
Risco de desabastecimento
Os seguidos reajustes dos combustíveis sequer garantem a estabilidade no fornecimento no país. Nesta terça-feira (19), quatro dias após negar risco de desabastecimento, a Petrobras recuou e admitiu que o país pode sofrer escassez de diesel e gasolina. A justificativa é o volume inesperado de pedidos dos distribuidores.
Segundo a estatal, a “demanda atípica” de encomendas para fornecimento de combustíveis em novembro ficou muito acima dos meses anteriores. Para atender o pedido, a empresa precisaria de “antecedência” para se programar.
O problema foi revelado na sexta-feira (15) pela Associação das Distribuidoras de Combustíveis (Brasilcom), representante de mais de 40 distribuidoras regionais. A entidade afirmou em nota que tinha ocorrido “uma série de cortes unilaterais nos pedidos feitos para fornecimento de gasolina e óleo diesel”.
O risco foi inicialmente refutado pela estatal, mas nesta terça, em nota pública, a empresa anunciou que está “maximizando sua produção e entregas, operando com elevada utilização de suas refinarias”.
A Petrobras informou que o parque de refino operou no primeiro semestre de 2021 com fator de utilização (FUT) de 79% – mesma média de 2020 e superior à de 2019 (77%) e 2018 (76%). Desde 2016, a empresa não ativa a capacidade máxima das instalações. Oito de suas 13 refinarias estão na lista de “privatizáveis” do desgoverno Bolsonaro.
Apesar de a estatal não ter monopólio sobre o refino no Brasil, a Petrobras ainda é a principal fornecedora de combustíveis no país. É dona de 13 das 18 refinarias em território nacional e concentra 98,6% da capacidade total de produção, conforme os dados da ANP relativos a 2020. Assim, os preços praticados pela empresa acabam tendo reflexo sobre toda a cadeia.
Nos últimos anos, a companhia não apenas mudou sua política de preços. Ela também mudou seu foco, hoje mais concentrado na extração de petróleo do que no refino, pontuou à BBC Brasil a professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) Julia Braga.
“O pré-sal é um sucesso retumbante, tem um custo baixíssimo, enquanto a parte do refino não tem tanta competitividade. Então prevaleceu essa ideia de ‘desverticalizar’ para preservar sua geração de lucro”, afirma a economista.
Uma capacidade menor de refino, diz a professora, significa maior dependência das importações, o que deixa a empresa com menor margem de manobra para amortecer as flutuações do mercado internacional sobre os preços.
“Agora a gente está vendo que esse outro extremo [em termos de visão para a empresa] ‘cobra seu preço’. Você perde esse instrumento que poderia ser usado para tentar não repassar de imediato toda a volatilidade que se vê nos preços do petróleo”, completa.
Veículos devolvidos às locadoras
De junho até agora, a disparada no preço dos combustíveis causou a devolução de 30 mil veículos às locadoras de automóveis por parte de motoristas de aplicativos. A estimativa é do presidente da Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (Abla), Paulo Miguel Junior.
“Acreditamos em retomada do mercado, se o preço do combustível voltar para um patamar mais baixo e se os aplicativos reajustarem o valor da tarifa, dando possibilidade para que eles (os motoristas) recomponham a renda mensal”, disse em coletiva nesta terça.
Segundo ele, muitos usuários tem tido dificuldade em conseguir motoristas de aplicativos nas grandes cidades. Os aplicativos negam que há falta de motoristas, embora as associações que representam a categoria já sinalizem uma debandada.
A Abla calcula que os motoristas de aplicativo alugavam 200 mil veículos das locadoras no início do ano passado. Esse número chegou a cair cerca de 80% no pico da crise sanitária, entre abril e maio, mas se recuperou no fim do ano.
As novas perdas passaram a chegar depois de junho deste ano, na esteira do aumento no preço da gasolina. O alto preço inviabiliza o negócio no lado dos motoristas. Hoje, o segmento aluga cerca de 170 mil veículos das locadoras. “Mas a gente tinha espaço para ter até uns 220 mil, 230 mil veículos de aplicativo, se tivesse frota e se o mercado estivesse bom”, lamentou o dirigente.
Da Redação da Agência PT