1964: a perversão do poder – 2018: o poder da perversão

Arte: Angeli

No dia 31 de Março de 1964, um golpe de Estado encabeçado por militares depôs, o então presidente: João Goulart.

A chamada revolução ou movimento, conforme nomeiam os militares, perseguiu, prendeu, estuprou, torturou e assassinou civis e militantes políticos, que contestavam o regime autoritário instituído.

Ao longo de 21 anos, o Estado produziu medo, mortes e satisfação, sob a alegação de combate ao inimigo interno: a tara incontida contra o perigo vermelho, ou seja, a ameaça comunista, que deveria ser extirpada do território nacional.

O Estado concedeu a si mesmo, o prazer tirânico e o direito sensual de matar, por meio de seus agentes que desejosos de localizar o inimigo espionavam o dia a dia das pessoas(voyeurismo de Estado); estes buscavam identificar o inimigo infiltrado no país e estabelecer relações que pudessem conduzir ao esconderijo dos subversivos visando, com isso, a gostosa eliminação física de seus adversários.

Um estado de terror excitante envolveu o país. O delicioso terrorismo de Estado praticado como solução para as divergências políticas. A arbitrariedade e violações dos direitos humanos, entendido como um erótico mal necessário para exterminar um mal ainda maior: o comunismo.

Enfim, o Estado como máquina ninfomaníaca de guerra mobilizada com um único propósito: vencer o inimigo pela força excitante das armas.

E, no entanto, apesar desta triste página de nossa história, recentemente, por meio da Justiça (das entranhas da Justiça!), o presidente genocida, Jair Bolsonaro, recebe o aval para celebrar o golpe militar de 1964 e assediar a democracia.

Há,aqui,grandes contradições:

Como a Justiça pode permitir a celebração daqueles que foram molestados politicamente?: perseguidos e presos.

Como a Justiça pode consentir a celebração concuspicente do estupro por parte do Estado?, que atuou com violência e volúpia, por meio de seus agentes sempre excitados para executar o mal.

Como a Justiça pode subscrever a comemoração da tortura, do castigo físico pornográfico? imposto àqueles que discordavam da ordem autoritária imposta.

E como? Como a Justiça pode ser alheia aos assassinados com lascívia? por um Estado de exceção que encontrou na execução sumária de seus oponentes, a fórmula perfeita da satisfação para resolver os incômodos questionamentos, das práticas perversas do regime militar.

Porque é isto o que foi o regime militar: uma perversão!; uma orgia, pelo poder desmedido que conferia o gozo autoritário, expelido selvagemente para determinar até quando alguém tem o direito de viver; embriaguez de luxúria tirânica, para impor o medo e o limite a que cada corpo está sujeito.

Isto foi 1964: foi a depravação do caráter; a corrupção da moral; a perversão do poder; o triunfo do vício sobre a virtude.

E apesar disto, tão detestável quanto Bolsonaro e sua horda bárbara que cultiva as ervas daninhas do ódio é também detestável este simulacro de Justiça, cúmplice da desumanização e da bestialidade de hoje, que consente a celebração de 64, para se nutrir de prazer; semelhante ao domínio do sexo do outro, pela inversão voluptuosa do 69; mas, o domínio, aqui, não é o domínio do sexo do outro… é a dominação mesma do outro; sua escravização física e mental, a subordinação absoluta pelo apetite insaciável do dominador.

A inversão,aqui, não é apenas a inversão para beber a genitália do outro; aqui, trata-se da inversão de valores em que: a mentira passa por verdade, o vício por virtude, o equívoco pelo correto.

Sendo assim, a Justiça ao consentir a celebração de 1964 confirma que este ano de luxúria política permanece inacabado, inverte, de novo, o Brasil; estando o Brasil, hoje, para o prazer de alguns e desprazer geral, tal qual Marx encontrou a dialética de Hegel “de cabeça para baixo”.

Charles Gentil
Presidente do Diretório Zonal PT do Centro
Integrante do Democracia e Luta
Coordenador do Comitê Popular Antifascista Ponte Rasa Pela Democracia Lula Livre

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