João Doria: como entender o fracasso de sua candidatura

Por Nelson Marques

Uma cena me chamou a atenção, há três semanas atrás, quando aconteceu o afundamento da pista local da Marginal Tietê, junto ao canteiro de obras da futura estação Santa Marina da Linha 6 do Metrô de SP (essa linha é a primeira a ser construída em SP através de uma parceria público privada, conhecida como PPP.

A cena é a seguinte: um helicóptero da Polícia Militar pousa no canteiro de obras da estação e a primeira pessoa a desembarcar é uma jovem (provavelmente a assessora de imprensa) com um vestido preto de seda, esvoaçante, e calçando um scarpin com um salto de pelo menos uns 12 cm; atrás dela desembarca, empedernido, João Doria.

Ele traja um jeans de grife, bem apertado em seu corpo de bailarino, e o tradicional sapatênis. Ambos cruzam a pista da Marginal Tietê em direção à cratera imensa que se abriu – nessa hora já repleta do esgoto que jorrou de um coletor afetado pelo tatuzão que escavava o túnel da nova linha.

Ambos fingem inspecionar o local, pisando na mistura de barro e esgoto que forrava a pista da Marginal, e partem para uma coletiva de imprensa. Não é preciso ser especialista em comunicação para perceber que aquelas figuras ridículas, em meio ao caos, à lama e ao esgoto destoavam completamente do cenário de guerra.

Essa cena explica boa parte do fracasso, até o momento, que é a candidatura de Doria à presidência. Ele não consegue passar um mínimo de autenticidade. Tudo o que faz parece sempre ter sido estudado longamente em frente a um espelho.

E ele está muito longe de ser um bom ator. Junta-se a isso, a exploração absurda que ele tentou com o desenvolvimento da vacina do Instituto Butantã. Todos os dias, durante meses, Doria estava na mídia para falar, como se fosse ele o criador da Coronavac e a maioria da população percebeu a tentativa mal-sucedida de transformá-lo num super-herói, que iria salvar a todos do coronavírus. Até porque, quem desenvolveu a vacina foi o centenário Instituto Butantã, tão querido da população brasileira, com verbas do governo federal, estadual e da iniciativa privada.

O tiro saiu pela culatra e a imagem de “falsiane” grudou em Doria. Enquanto o governador tentava faturar com a vacina do Butantã, as cidades paulistas se enchiam de moradores de rua esfomeados, implorando por ajuda em todos os cantos. Vários canteiros das principais avenidas e praças da cidade de São Paulo se transformaram em acampamentos de sem-teto, despejados de suas casas por falta de dinheiro para o aluguel.

Doria, seu vice e candidato ao governo de SP Rodrigo Garcia e o prefeito paulistano Ricardo Nunes fingiram não enxergar essa tragédia e nada fizeram pra minimizar o sofrimento desses paulistas e paulistanos. Agora, colhem os frutos…

Nelson Marques é jornalista, editor do Construir Resistência e produtor de vídeos

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