A Ponte para o Futuro de Michel Temer, essa controversa obra que, desde o impeachment, tantaenergia tem consumido, já foi chamada de pinguela.
Suas três medidas mais alardeadas eram a reforma trabalhista, o teto de gastos e a reforma da Previdência.
As duas primeiras, o próprio Temer aprovou. A última está para ser entregue por Bolsonaro. O que os deputados acabam de aprovar difere pouco da proposta do governo anterior.
A agenda Temer segue seu curso e a mesma política econômica entra no seu quarto ano com sólida base parlamentar e sem resultados positivos palpáveis.
Quatro anos de estagnação já garantidos na mais lenta retomada da atividade econômica num quadro pós-recessão.
Até os mais céticos imaginavam um início de governo mais animado. Bolsonaro, no entanto, queimou a largada com uma agenda tresloucada que já lhe custou a lua de mel.
O que esperar da conclusão desta etapa da obra?
Alguns pesquisadores dão como certo o aumento da desigualdade.
A reforma trabalhista tornou ainda mais precário o mercado de trabalho, reduzindo o salário médio direto e benefícios.
O teto de gastos vem diminuindo gradualmente o chamado “salário indireto”, pago pelo Estado na forma de serviços públicos ou transferência de renda.
E agora, a reforma da Previdência aumenta a desigualdade no acesso à aposentadoria. Segundo Thomas Piketty e outros (Valor, 11/7), as novas regras, no que concerne aos mais pobres, são injustas.
A reforma Bolsonaro reduz tanto o valor da aposentadoria parcial quanto da aposentadoria integral.
Se, além disso, considerarmos que em média os trabalhadores só conseguem contribuir para a Previdência seis meses por ano, a idade mínima de 65 anos seria apenas uma referência ilusória.
A aposentadoria parcial, de valor reduzido, só seria possível aos 77 anos de idade, e a integral seria quase inalcançável.
De outro lado, economistas da UFMG (Valor, 11/7), dentre outros, alertam para o risco contracionista da reforma da Previdência. Ela teria efeito negativo sobre o consumo presente das famílias e, numa economia estagnada, isso poderia não ser compensado pelo aumento esperado do investimento privado.
Haveria espaço para um corte de juros, mas, dada a estrutura do mercado de crédito no Brasil, ele não chega ao tomador final.
Tirante o decênio 2003-2012, em que crescemos e distribuímos renda, os últimos 40 anos têm sido desalentadores quanto à geração de empregos e o combate às desigualdades.
Se pinguela quer dizer passagem estreita para poucos, talvez tenhamos aí a imagem da obra.
Fernando Haddad
Professor universitário, ex-ministro da Educação (governos Lula e Dilma) e ex-prefeito de São Paulo
*Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo