Atingindo em cheio população negra, pandemia amplia desigualdade

Uma pesquisa conduzida em São Paulo sobre os efeitos do coronavírus na população mostra que negros estão mais sujeitos a contrair a doença do que brancos. De acordo com o levantamento, a população negra é infectada 2,5 vezes mais pelo vírus do que a de brancos. Para chegar a essa conclusão, foram colhidas amostras de sangue, entre os dias 15 e 24 de junho, de 1.183 pessoas, todos maiores de 18 anos, em 115 regiões do município. Os números revelam que 19,7% dos participantes que se identificam como negros possuem anticorpos contra a covid-19. O percentual, no entanto, caiu para 7,9% entre os que se declararam brancos. 

O estudo foi conduzido pela Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) com apoio do Instituto Semeia e participação do Laboratório Fleury e Ibope Inteligência. Ao utilizar dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para separar as regiões com maior e menor renda, o estudo, que está na segunda fase, escancara a gritante desigualdade social no país. O abandono das populações carentes pelo governo federal, verificado pelos índices sociais antes mesmo da pandemia, preparou o terreno para a catástrofe atual. 

Ao coletar os dados, os pesquisadores  verificaram que a infecção pelo coronavírus é menor em áreas onde moradores possuem maior escolaridade. O número de infecções é, por exemplo, 4,5 vezes maior em pessoas sem ensino fundamental completo, se comparada com os que terminaram o ensino superior: 22,9% e 5,1%, respectivamente.

“É como se tivesse duas epidemias correndo ao mesmo tempo na cidade”, constata o infectologista Celso Granato, diretor Clínico do Grupo Fleury, pesquisador líder do projeto, em depoimento à ‘Agência Estado’. “Não dá para comparar, mas traduz a expansão que afeta mais os que têm menos recursos, porque são os que precisam ir trabalhar, porque têm menos condições de fazer o isolamento”, observou.

Criança na comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro. Foto: Reprodução

Subnotificações

Os números oficiais do Covid-19 no Brasil são alarmantes. Nesta sexta-feira (3), um dia depois de o país assistir, estarrecido, aglomerações em bares do Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro, foram confirmados 1.508.991 casos da doença e 62.304 mortos, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa. Projeções da Universidade de Washington apontam que o país pode ter 160 mil mortos até outubro. Atingindo em cheio comunidades carentes e a periferia, cuja população – sintomática ou não – não é testada, a pandemia, no entanto, pode ser bem maior do que o noticiado.

Uma pesquisa conduzida pela Universidade de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul, revelou que o coronavírus pode ter infectado até seis vezes mais pessoas do que a contagem oficial do governo indica. Pesquisadores entrevistaram quase 89.397 mil pessoas em 133 cidades de todos os estados e o Distrito Federal, além de aplicarem, aleatoriamente, testes rápidos para identificar anticorpos da doença. Entre os testados, 2.064 receberam diagnóstico positivo. 9% eram assintomáticos.

A pesquisa passou por três fases. Após a finalização da última, no final de junho, os cientistas constataram que o índice dos que tinham testando positivo em maio subiu de 1,9% para 3,8% na terceira fase do estudo.

O levantamento também confirmou o que parlamentares do PT alertam desde o início da pandemia. As classes menos favorecidas são mais vulneráveis ao avanço do vírus no país. Moradores de comunidades carentes e da periferia têm enfrentado dificuldades para encontrar as melhores condições para se proteger. 

“Se nós pegarmos o dado de basicamente qualquer uma das fases, os 20% mais pobres da população tem o dobro da infecção do que os 20% mais ricos da população”, afirmou o pesquisador da UFPel, Pedro Hallal, em entrevista coletiva. “E esse resultado é bastante consistente ao longo das três fases da pesquisa”, disse.

Da Redação da Agência PT

Foto de destaque: Bruno Itan

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