Depois de trégua pré-eleitoral, racionamento de água volta com força total em São Paulo

Poucos dias após a reeleição do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), a misteriosa falta de água noturna voltou a assombrar a população das periferias da capital paulista. “Voltou ao `normal`. Depois das 20h só sai ar das torneiras”, ironizou o sociólogo Gérson Brandão Júnior, morador do Jardim Romano (zona leste), que havia relatado o fim do racionamento secreto na sexta-feira (3), dois dias antes da eleição. No entanto, a medida agora se alastrou para a zona sul da cidade, onde a RBA ainda não tinha ouvido reclamações.

“E agora, com esse calorão, o mais legal é saber que ao chegar em casa da faculdade, depois de um longo dia de trabalho, já tarde da noite, não haverá água para um banho refrescante”, continua Brandão. Ele já tomou vários banhos de canequinha e tem um pequeno “exército” de garrafas pet cheias de água em casa para garantir as necessidades do dia a dia.

A técnica continua a mesma relatada pela reportagem da RBA há um mês atrás: a partir das 19h a água começa a perder pressão e se esgota nas torneiras. Quem não tem caixa d`água – ou tem uma família numerosa e um reservatório pequeno – tem de estocar o líquido em garrafas pet, galões e baldes. O fornecimento só vai ser regularizado na manhã seguinte.

Na Cidade Tiradentes, zona leste, a auxiliar de limpeza Ana Cristina Ramos sofre com o mesmo problema, que foi interrompido às vésperas da eleição e voltou com força no último dia 6. “Todo mundo estranhou ter água no dia (da eleição). Mas agora, a água acaba sempre a partir das 20h e só volta as 6h da manhã do dia seguinte”, descreveu.

Até regiões que ainda não tinham registro do problema estão começando a senti-lo. É o caso do bairro Recanto Campo Belo, no distrito de Parelheiros, no extremo sul da cidade, onde o historiador Magno Duarte contou que desde a última quarta-feira (8) a água não chega direito na casa dele. “Não chega água até a madrugada. O que vem, deve estar ficando nos bairros mais baixos, porque quase não chega aqui”, afirmou.

Para matar a sede, tomar banho e cozinhar, a família está guardando água em um tonel de 150 litros e onde mais for possível. “O que me deixa mais irritado é perceber que foi exatamente com o fim da eleição que se escancarou o estado crítico. E que `seguraram` o racionamento até o limite para garantir os votos”, indignou-se Duarte.

No Jardim Eliana, no Grajaú, zona sul, o músico Leandro Bastos de Andrade também percebeu que a água está sumindo durante a noite. “Depois da meia-noite tem faltado água todos os dias. Faltou antes e falta agora, depois da eleição”, explicou.

As duas regiões da zona sul são abastecidas pelo Sistema Guarapiranga e não pelo Cantareira, onde a crise hídrica foi oficializada em 20 de janeiro deste ano. Os bairros no extremo da zona leste são abastecidos pelo Alto Tietê. O motivo para a “migração” da falta de água pode ser utilização da água dos outros mananciais para suprir parte da demanda do Cantareira, que abastecia cerca de oito milhões de pessoas normalmente e agora supre 6,5 milhões.

A Sabesp está bombeando a água do chamado volume morto – que fica abaixo do nível das comportas de captação por gravidade – do Cantareira desde maio. O volume foi dividido em duas cotas e a primeira deve se esgotar no fim deste mês. A companhia já solicitou autorização para a Agência Nacional de Águas (ANA) para utilizar a segunda cota.

No entanto, o presidente da agência, Vicente Andreu, ironizou a proposta afirmando: “É mais fácil o meu Palmeiras chegar em primeiro no Campeonato Brasileiro do que o plano funcionar. Não tem nenhum amparo técnico na realidade”.

Na última sexta-feira (9), a Justiça Federal em São Paulo proibiu a utilização da segunda cota e mandou a Sabesp reduzir o volume de água bombeado. O juiz Miguel Florestano Neto, da 3ª Vara Federal em Piracicaba, acolheu os argumentos dos Ministérios Públicos estadual e federal de que a companhia está fazendo uma gestão muito arriscada do sistema e que a utilização de tal volume coloca em risco o abastecimento das cidades na região de Campinas e Piracicaba.

O magistrado também ressaltou, apoiado nos argumentos dos MPs, que a Sabesp e os órgãos reguladores – ANA e Departamento de Água e Energia Elétrica (Daee, estadual) – tinham conhecimento da crise que se aproximava desde 2011, mas nada fizeram para evitar os problemas.

Na mesma sexta-feira a Sabesp apresentou um plano de contingência para a ANA, em que propõe a redução na vazão dos atuais 19,7 metros cúbicos por segundo (m³/s) para 19 m³/s assim que o plano for aprovado, e para 18,5 m³/s a partir de novembro. No início do ano, a Sabesp retirava 31 m³/s.

Fonte: Rede Brasil Atual

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